
O primeiro é o da rua que chamávamos de “da alegria”. Era onde brincávamos mais... meus melhores amigos de infância moravam nela. De fato era a rua da alegria. Durante muito tempo ela permaneceu sem pavimento, mas a areia suja não diminuía a nossa vontade de brincar. Esconde-esconde, bandeirinha, garrafão, polícia e ladrão, bola... naquela rua todas as brincadeiras eram mais animadas e os moradores dela sempre foram simpáticos com a criançada que ia brincar lá, mesmo os que nem moravam no conjunto.
A outra rua, a minha, é a “rua do veio”. Chata, parada, triste... a rua que eu morava não era o point da galera. Tava mais para um caminho escuro e estranho que os moradores da “rua da alegria” tinham, por obrigação, que passar todos os dias. Na rua do veio não havia brincadeiras. Os moradores mais antigos sempre reclamavam do barulho na frente de suas casas e um deles, o “veio”, fazia de tudo para manter as crianças longe da frente de sua casa. Meus dias de menino eram sempre do mesmo jeito: acordava, comia e corria para a rua da alegria. Só voltava em casa perto da hora de ir para a escola.
Mas, a rua do veio não era de tudo ruim! Havia a “veia”. Dona Creusa, uma senhora reservada que morava em um dos sobrados. Todos tinham medo de Dona Creusa, menos eu! Diziam que ela era uma bruxa, porque podia-se ver pelos portões que ela tinha um caldeirão de ferro na área de sua casa, mas era só um objeto decorativo que ela trouxera de sua terra natal, São Paulo. Dona Creusa e eu éramos amigos. Eu sempre podia ir à casa dela e tinha a liberdade de entrar a hora que eu quisesse. Além de mim, meu irmão também frequentava muito a casa da “veia”, íamos sempre que a "rua da alegria" tava parada. Lá Dona Creusa nos apresentava à coisas que nunca tínhamos visto, coisas de sua infância no interior de São Paulo. Ela colecionava várias coisas, mas a coleção mais querida dela era a de cartões telefônicos. Logo estávamos colecionando também... e tão logo tínhamos um punhado deles, a febre de colecioná-los já tinha dominado a rua da alegria.
Durante muito tempo as crianças daquelas ruas mantiveram o hábito e a disciplina de colecionar os cartões. Conseguindo os que ainda não tinham, guardando-os em seus esconderijos, mantendo-os limpos e arrumados e ainda faziam questão de descobrir o conhecimento que aqueles simples cartões traziam.
E assim são os caminhos que conheci quando criança: o primeiro é o da diversão. Um caminho onde podemos ser quem quisermos e a felicidade que os bons amigos trazem alimentam o nosso dia com boas gargalhadas e a única preocupação é saber em qual time do jogo você vai ficar; o outro caminho nos leva ao lado rude da vida, fechado para as brincadeiras, mas aberto ao conhecimento. É o caminho da seriedade, que também é o do conhecimento, cultura e da dedicação.
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